Bom demais saber que a luta em defesa do Cerrado não tem fronteiras. Publico artigo do amigo deputado federal Pedro Wilson (PT-GO), que mostra que temos poderosos irmãos belgas cônscios da importância deste nosso bioma.
Cláudio.
A destruição insinuante da biodiversidade brasileira
“O quanto em toda vereda em que se baixava,
a gente saudava o buritizal e se bebia estável.
Assim que a matlotagem desmereceu em acabar,
mesmo fome não curtimos, por um bem: se caçou boi.
A mais, ainda tinha araticúm maduro no cerrado.”
Guimarães Rosa
em Grande sertão: veredas.
* Pedro Wilson
O artigo The Creeping Destruction of Brazilian Biodiversity (A destruição insinuante da biodiversidade brasileira), reforça o que há muito vimos afirmando em nossa peregrinação. Escrito por Bart Staes e Bas Eickhout (ambos membros do Parlamento Europeu) e Luc Vankrunkelsven (ONG Wervel), a partir de Bruxelas, Bélgica e por ocasião da COP-16 e da COP-10, ressalta que as campanhas internacionais para a preservação da Amazônia são um sucesso, já que o corte de árvores diminiu bastante, mas afirma como efeito colateral negativo o desmatamento três vezes maior do bioma Cerrado. Segundo eles, o que não muda é a lógica econômica: imensas plantações de monoculturas como a soja, o eucalípto, a cana-de-açúcar e o milho, que geram grandes lucros, mas consequências sociais e ecológicas tão graves como seria o desaparecimento da Amazônia.
Chama a atenção para o risco de fim do processo de gestão e purificação da água feito naturalmente por este ecossistema, como resultado do desmatamento e outros danos causados pelo bicho homem. Cita como exemplo o “Catskill Mountains”, em Nova York, uma área florestal que atua como tratamento de água natural, ao invés de precisar construir uma caríssima estação de purificação de água. Para os estudiosos, o nosso Cerrado oferece uma grande quantidade desses serviços “invisíveis e indispensáveis”, por ser não apenas uma riqueza de biodiversidade, mas crucial também para o sistema hidrológico do brasileiro, já que é fonte básica de alimentação para os rios.
Alertam que quase todo o Brasil depende da água proveniente do Cerrado para a produção da sua eletricidade. Principalmente afirmam que o bioma é fonte de muitos rios que correm aqui e no restante da América Latina, com relevância global. “O balanço hídrico é essencial para o Cerrado, para o Brasil, para a América Latina e, portanto, para o planeta”.
Os membros do Parlamento Europeu ressaltam como uma das propriedades do Cerrado a capacidade de, ao longo de milhões de anos, ter formado enormes reservatórios de água. E denunciam que os mesmos poderão, em uma década, secar – devido ao intenso desmatamento (30.000 km2/ano) e o plantio de monoculturas intensivas em água, como soja e cana-de-açúcar.
Bart Staes, Bas Eickhout e Luc Vankrunkelsen apontam que as consequências da estagnação do Cerrado já podem ser sentidas nas principais áreas agrícolas do Brasil, notadamente na parte meridional do País. “Nos últimos cinco anos, os agricultores dos três estados agrícolas no sul do Brasil têm sofrido grandes perdas por causa do calor excepcional”. Ressaltam que em Cuiabá, terra da soja, as temperaturas médias estão subindo e a vida é cada vez mais difícil. “No Mercosul existem neste momento 30 milhões de hectares em fase de transição para se tornar deserto”, segundo eles, um efeito direto do plantio de monoculturas.
Mas a boa nova para esses honrosos membros do Parlamento Europeu é que a conscientização sobre a catástrofe ecológica e social aumenta a cada dia. Eles citam o nosso Fórum Goiano em Defesa do Cerrado e outras importantes organizações não governamentais como referenciais importantes para a construção de um consenso quanto à importância e riqueza desta “região única e as crescentes possibilidades de comércio justo e sustentável”.
Defensores de uma economia regional não baseada na invasão da monocultura, mas na policultura original, consideram essencial uma prática que beneficie a todos: ecosssitemas, habitantes locais, a agricultura, a fauna, a flora, o balanço hídrico, a população urbana e o clima mundial.
As catástrofes que vem acometendo milhões de pessoas mundo afora, entre elas a que ocorre na região serrana do Rio de Janeiro, são duros avisos da mãe natureza. Mostram que como seres ‘iluminados’, não estamos cumprindo o dever de casa: prevenir, preservar, recuperar -- cuidar do que nós temos destruído há séculos.
Está claro que para o equilíbrio do planeta devemos respeitar o modo de agir e viver do outro e da natureza. Este movimento em defesa do meio ambiente e pela garantia de um desenvolvimento sustentável, tem que ser global e local.
São fundamentais as decisões da Conferência da ONU para Mudanças do Clima/ COP-16, em Cancún/México, e da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU/COP-10, em Nagoya, Japão, ocorridas ano passado. Chamam à responsabilidade, governantes de todo o mundo para os problemas ambientais. Relevante também a atuação de organizações não governamentais internacionais.
No Brasil, importantíssima a diretriz do governo Dilma Roussef de cuidar “para que o País tenha um modelo de desenvolvimento ao mesmo tempo sustentável e inclusivo”, dando sequência ao trabalho do Presidente Lula. Estão entre as 13 diretrizes do nosso governo: o combate ao desmatamento, assim como a proteção de nossos biomas, “em especial a Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica”. Precisam continuar e ser ampliadas as campanhas e ações de governo em defesa desses biomas.
Do nosso Cerrado – nossa aldeia local e global – desejamos e lutamos por vida longa ao pequi, buriti, araticum, mangaba, cagaita, cajuzinho, bacupari, baru, anta, ariranha, bugio-preto, cachorro-do-mato, jaratataca, capivara, cervo, cuíca, cutia, gambá, gato-do-mato, gato-maracajá, jaguatirica, lobo-guará, água, ar.
* Pedro Wilson é deputado federal (PT-GO), membro da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, ex-Prefeito de Goiânia e professor da UFG e PUC-GO.
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